A Emenda Dante de Oliveira e o movimento das Diretas Já foram dois momentos cruciais na luta pela redemocratização do Brasil, ainda na década de 1980.
Esses eventos foram o resultado de uma série de insatisfações populares e da organização de diversos setores da sociedade, em um período em que o país vivia sob uma ditadura militar (1964-1985).
Para entender a importância desse momento histórico, é preciso contextualizar o cenário político da época e as consequências que a não aprovação da emenda e a mobilização das Diretas Já tiveram para a redemocratização brasileira.
O Contexto Histórico: Ditadura Militar e a Repressão Política
Em 1964, o Brasil foi tomado por um golpe militar que depôs o presidente João Goulart, instaurando uma ditadura que duraria mais de duas décadas. Durante esse regime, os militares governaram o país sem eleições diretas para presidente, enquanto a oposição era duramente reprimida.
Direitos civis foram cerceados, dissidentes políticos perseguidos, e a censura tornou-se uma prática comum. Ao longo dos anos, movimentos estudantis, operários e de setores progressistas da sociedade protestavam contra o regime, clamando por uma abertura democrática.
A partir do final da década de 1970, o Brasil começava a sentir os efeitos de uma crise econômica, marcada por inflação alta, estagnação econômica e desemprego crescente. Paralelamente, surgiram sinais de abertura política com o fim do AI-5 (Ato Institucional Número Cinco) em 1978, que havia sido o marco da repressão mais severa do regime.
Esse processo de distensão, contudo, ainda era lento e controlado pelos militares. A sociedade civil, especialmente através de movimentos sociais e partidos de oposição, como o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), exigia maior celeridade e clamava por um retorno à democracia plena.
O Movimento das Diretas Já
A campanha pelas Diretas Já, iniciada em 1983, foi uma das maiores mobilizações populares da história política do Brasil. O objetivo principal desse movimento era conquistar eleições diretas para a presidência da República, como forma de garantir a participação popular na escolha de seus governantes.
O movimento ganhou força a partir da apresentação de uma proposta de emenda constitucional, a Emenda Dante de Oliveira, apresentada pelo então deputado federal do PMDB, Dante de Oliveira, em 1983.
A proposta da emenda era clara e objetiva: restabelecer as eleições diretas para a presidência da República, que desde o início do regime militar, em 1964, eram realizadas de forma indireta, ou seja, através de um colégio eleitoral controlado pelo regime.
O retorno às eleições diretas era visto como o caminho mais legítimo para a redemocratização do país e para devolver ao povo o poder de escolha de seus líderes.
A Mobilização Popular
A luta pelas Diretas Já mobilizou milhões de brasileiros nas ruas. As grandes manifestações começaram em 1984 e reuniram não apenas políticos de oposição, mas também artistas, intelectuais, sindicalistas e diversos segmentos da sociedade civil.
As maiores concentrações aconteceram em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, e chegaram a reunir mais de um milhão de pessoas em alguns comícios.
Entre os principais líderes que apoiaram o movimento estavam figuras como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Leonel Brizola, Luiz Inácio Lula da Silva e muitos outros. Além disso, personalidades da música, do teatro e do esporte usaram sua visibilidade para impulsionar a campanha.
Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque e outros artistas foram fundamentais para trazer a cultura popular para dentro do debate político.
A ampla adesão ao movimento reflete o desgaste do regime militar e o desejo crescente da população por mudanças. A democracia, que fora suspensa por mais de 20 anos, era reivindicada como direito básico e essencial para o desenvolvimento político e social do país. O lema “Eu quero votar para presidente” unificou um país cansado da repressão e da falta de participação política.
A Emenda Dante de Oliveira
A Emenda Dante de Oliveira, de número 5, foi apresentada ao Congresso Nacional em março de 1983. Seu texto previa a realização de eleições diretas para presidente da República já em 1985, quando terminaria o mandato do então presidente João Figueiredo, último general a ocupar a presidência durante a ditadura.
No entanto, apesar de toda a mobilização popular e o apoio de importantes líderes políticos e sociais, a emenda não foi aprovada. No dia 25 de abril de 1984, a emenda foi votada na Câmara dos Deputados, mas não obteve os 2/3 dos votos necessários para passar.
Foram 298 votos a favor, 65 contrários e 3 abstenções, mas o quórum de 320 votos exigidos pela Constituição não foi atingido. O resultado foi um enorme desapontamento para o movimento das Diretas Já, que acreditava na possibilidade de mudanças por meio da aprovação da emenda.
As Consequências da Rejeição
A derrota da Emenda Dante de Oliveira não significou, no entanto, o fim da luta pela redemocratização. Pelo contrário, o movimento das Diretas Já conseguiu consolidar a oposição ao regime militar e abrir espaço para o fim da ditadura, que já se encontrava em seus últimos momentos.
Mesmo sem a aprovação da emenda, a pressão popular forçou os militares a aceitarem uma transição para um governo civil, ainda que de forma controlada.
Em 1985, após a rejeição das eleições diretas, o colégio eleitoral elegeu indiretamente Tancredo Neves como presidente, encerrando oficialmente o ciclo militar no Brasil. Tancredo, que era o candidato da Aliança Democrática (uma coalizão entre o PMDB e dissidentes do PDS), não chegou a assumir a presidência devido à sua morte inesperada, mas seu vice, José Sarney, tomou posse, marcando o início de um novo período político no país.
Legado
A Emenda Dante de Oliveira e o movimento das Diretas Já deixaram um legado significativo para a história política do Brasil. A mobilização popular que tomou as ruas do país foi crucial para a transição para a democracia, mesmo que as eleições diretas para presidente só viessem a ocorrer em 1989, com a eleição de Fernando Collor de Mello.
Esse episódio histórico mostrou a importância da participação popular na política e a força da sociedade civil organizada. Mais do que uma simples campanha, as Diretas Já simbolizaram a resistência ao autoritarismo e o desejo de construir um Brasil mais democrático e participativo.
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